Suely Tonarque(*)
Minhas experiências com minha avó Rosa Garibaldi ainda estão guardadas no lugar das memórias afetivas – italiana, baixinha, olhos azuis, cabelo loiro, às vezes de permanente, magrinha e sempre com um sorriso quando os netos e netas chegavam.
O pão feito por ela é assado em forno à lenha, o “tortéis” (de abóbora, recheado de carne moída), cozido num caldeirão bem grande e coberto de molho de tomate, muito queijo ralado e direto para o forno durante 10min, servido quente… e todos esperando com água na boca!
Doce de abóbora com cravo ou doce de leite… Momentos de comemoração no domingo de Páscoa quando meu pai, Albertino, nos levava de Rancharia (Estado de São Paulo), a 139 km de Araçatuba (onde morávamos na década de 1960).
Muitos netos e netas a Rosa tem; cada um(a) de nós tem histórias diferentes para as lembranças guardadas nas memórias do bem-querer.
No encontro em comemoração aos Avós, lemos o texto da escritora Rachel de Queiroz – “A arte de ser Avó” – e faço uma conexão da minha escuta com a arte de ser neta da Rosa – as avós contam com as vozes calmas, privilegiadas, a doçura de ter netos e netas. É o presente do universo – faço doces preferidos, as sopas, o leite do jeito que gostam, brinco, canto e ajudo a esconder o que os pais proíbem: principalmente, deixo usar o celular… Sim, ouvi!!!
Minha vó dizia: – “Minha velhice compensa pela quantidade de netos que ganhei e todos são especiais, mesmo o mais travesso!!!” Não esperava tantos presentes, ou melhor, tantos netos: 28. Rosa teve 4 filhos e 4 filhas. Atualmente, neste século XXI, os casais têm de 1 a 2 filhos e 1 a 2 netos – a vida e as escolhas, o padrão, a forma, o planejamento, as expectativas mudaram, se transformaram. E não sei responder se é para melhor ou para pior; mas mudaram!
No livro “As mais belas coisas do mundo”, de Valter Hugo Mãe – Editora Biblioteca Azul, na página 24, o avô pergunta ao neto: – “Quais seriam as coisas mais belas do mundo?”. O neto reponde: – “Pensei que poderiam ser os filhotes de cães, alguns gatos, o fim do sol, o verão inteiro, o comportamento dos cristais, a muita chuva, a cara das mulheres, a nuvem que vimos igualzinha de um avião…”. O avô sorri e quis saber se não haviam de ser a amizade, o ser-se fiel, educado, o ter-se respeito por cada pessoa. Ponderou se o mais belo do mundo não seria fazer-se o que se sabe e pode para que a vida de todos seja melhor”. (pág.26).
Sinto e penso que cada um de nós tem seus avós em nosso coração. Uma semana antes de o meu pai morrer (1990), no sonho, minha vó Rosa diz: – “Seu pai vai embora, não fique triste”. Acordo assustada e volto a dormir. Minha vó, meu pai, minha mãe, minhas madrinhas precisaram morrer, mas todos estão vivos e ainda falo com eles nos sonhos…
(*) Suely Tonarque é psicóloga, gerontóloga e especialista em moda no envelhecer